Sejamos honestos: Que futuro tem um governo que toma conta de um orçamento de R$5,86 trilhões e só pode definir como gastar, de fato, R$11,7 bilhões?
Ao menos pelo texto que o governo Lula enviou ao Congresso na última sexta-feira esse será o “espaço” que o governo tem para gastar uma vez que no limite de despesas (que vai aumentar R$ 143,9 bilhões, de acordo com as regras do arcabouço fiscal R$ 132,2 bilhões serão destinados ao pagamento de gastos obrigatórios de modo que o que sobra, de fato, não chega a R$ 12 bilhões.
Mal comparando, no próximo ano, o governo Lula não tem dinheiro para pagar uma corrida de aplicativo dentro de Brasília que não esteja prevista na lista de despesas.
Falácia do zero
Deve ser mesmo uma tristeza para um gestor escrever um orçamento onde pela lei não pode ter déficit, fazer uma previsão de todas as despesas que não podem deixar de ser pagas conforme a lei e atender ao desejo de todo governante eleito de criar um programa que possa ser novidade e tenha condições de causar impacto.
Só que essa é a situação real do Executivo brasileiro que no meio desse pacote de despesas ainda tem que pagar R$38,9 bilhões de emendas parlamentares sobre as quais não tem qualquer domínio. Virou o clássico caso de arrecadar para pagar. E arrecadar mais paga pagar, de fato, porque há uma enorme chance de para cumprir a obrigação de sair a conta pela receita o ordenador de despesa super estimar a receita para cobrir a despesa subestimada.
Verba de trilhão
Para se ter uma ideia do que orçamento público brasileiros é importante ver os grandes números. Dos R$5,87 trilhões, R$2,77 trilhoes vão para despesas financeiras, como pagamento de dívidas. Outros R$2,93 trilhoes vao para pagar as despesas primarias, como aposentadorias, pensões, salários, custeio e obras.
A União espera alcançar uma receita primaria total de R$2,91 trilhoes em 2025 (23,5% do PIB). O dinheiro vem, por exemplo, da arrecadação de tributos e das concessões. Parte do dinheiro (R$558,7 bilhoes) deve ser transferida para estados e municípios. No geral a conta é zero.
Sobra de centavos
Mas quando se observa o que esses números agregados é que se observa como ao longo dos anos o Congresso e o próprio executivo foram assumindo compromissos fixos para uma receita que naturalmente é variável já que depende da performance da economia que gera o pagamento de impostos.
O bicho começa quando o governo define que o salário mínimo vai ser de R$1.509,00 porque a lei manda corrigir o valor em relação ao ano anterior. E como o salário mínimo é base para pagar a conta da previdência ele tem que reservar R$1,01 trilhão. Todo mundo no governo sabe que R$1,01 trilhão não vai dar porque o nível de afrouxamento de controle na concessão de benefícios é tão grande que todo mundo sabe que vai gastar mais.
Modelo ruim
Mas tudo que é ruim pode piorar e o modelo usado pelo Brasil é velho e ineficiente porque ele garante o benefício sem saber se vai ter o dinheiro para pagar. Por exemplo, uma lei de 2024 (PLN 26/2024) assegura o cumprimento dos pisos fixados pela Constituição e pelo novo regime fiscal. A Saude, de cara, vai ter que ter R$227,8 bilhoes que vai ser 6,4% maior que o de 2024. Para a Educação serão R$113,6 bilhoes que será 4,8% do orçamento deste ano.
Apesar de, a cada ano, o Executivo está se transformando numa tesouraria que apesar de emitir a ordem de despesa sem ter nenhuma ingerência no gasto o governo ainda diz que vai investir.
Faz de conta
Então o discurso é vamos aplicar R$170,84 bilhões, no combate à fome e Redução das Desigualdades, mais R$19,42 bilhões na educação básica, R$37,73 bilhões na saúde, estamos reservados R$60,92 bilhões para o Novo PAC. O que nos leva à seguinte pergunta: será que o presidente acredita que pode mesmo promover o aceleramento do crescimento com esse dinheiro? Certamente que não.
Mas fazer o quê? Nesta quinta-feira , a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet reconheceu que da forma como o governo organiza suas contas não existe cenário previsível. Até porque como ela admite falar de uma agenda de revisão estrutural dos gastos precisaria levar em conta o tempo e a vontade política.
Carimbo digital
O que hoje não existe e, certamente, nunca vai existir até o dia em que o funcionamento do governo seja colapsado pelo seu próprio modelo de gestão.
Um cenário frustrante para qualquer gestor público que se atreva a olhar de fora a situação e se perguntar: para que serve toda estrutural de governo online, gestão fiscal em tempo real e estrutura jurídica se no fundo tudo se resume a pagar despesa obrigatória cuja única diferença do passado é ter substituído o carimbo pela certificação digital.