Instrumentos legais que regulam as políticas públicas ganham importância num cenário de planejamento escasso, e execução orçamentária vinculada a definições políticas nem sempre atreladas às demandas mais antigas da população. Na verdade, a cobrança de planos municipais de saúde, educação, segurança ou para leitura e bibliotecas, por exemplo, nem precisaria existir na legislação, caso os gestores se antecipassem ao cumprimento das leis. Afinal, prefeitos e suas equipes de governo estão em seus postos para cuidar dos cidadãos, identificando os problemas e apresentando soluções condizentes com a capacidade de gasto e crédito dos municípios, buscando sempre a viabilização de mais recursos para os programas, projetos e obras, junto ao estado, ao governo federal e até a organismos internacionais. O que não é aceitável é que a população fique esperando anos ou décadas, para que as políticas necessárias venham a ser implementadas.
Mas de acordo com o Tribunal de Contas do Estado (TCE), pelo menos 84% dos municípios pernambucanos não dispõem de marco legal pela primeira infância. E mais da metade, 99, não elaboraram ainda os planos municipais para a área. As explicações sugeridas pelo auditor Diego Maciel, do TCE, são de que há falta de capacitação para a tarefa, e financiamento que garanta o cumprimento dos direitos das crianças de até 6 anos de idade. Além disso, o auditor menciona ainda uma “baixa compreensão sobre a importância dos primeiros anos de vida para o desenvolvimento integral do ser humano”.
Em que pese a dificuldade administrativa de problemas de formação dos agentes, bem como para a aquisição dos recursos para os programas, é bom lembrar que os gestores públicos municipais não podem se eximir da questão, e muito menos, desconhecer o valor de políticas específicas para os direitos da primeira infância. É lamentável que o cenário em Pernambuco – e em outras partes do Brasil – revele tal grau de ingerência, ou mesmo descaso dos prefeitos com relação a essa demanda. O cuidado integral com a criança nessa faixa etária representa a base para o desenvolvimento humano, conferindo tranquilidade à família, e sobretudo a mães sobrecarregadas com os múltiplos papeis que desempenham numa sociedade ainda machista, especialmente no Nordeste.
A ausência de um marco legal com princípios e diretrizes é outro sinal de descaso corrente nos municípios pernambucanos. Sua elaboração requer a participação de vozes diversas, de maneira democrática e transparente, para que as soluções apresentadas sejam tomadas de acordo com a priorização e particularidades locais. Para quase 10% da população de Pernambuco, ou 840 mil crianças de até 6 anos, a dependência dos serviços públicos para o respeito aos direitos da infância aguarda a iniciativa dos municípios. Enquanto não houver a responsabilização gerencial devida, o atraso vai continuar, deixando mais uma geração desassistida.