A atriz e gestora cultural Leda Alves, ex-Secretária de Cultura do Recife, morreu na manhã deste sábado (4), aos 92 anos, deixando o grande legado para o setor no Estado. De acordo com informações de familiares, a artista morreu de causas naturais em sua casa, no Recife.
O velório será realizado neste domingo (5), na Capela de Santo Amaro, Centro do Recife, assim como a missa. A cremação ocorrerá no cemitério Morada da Paz, no município do Paulista. Os horários de ambas as cerimônias ainda serão confirmados. De acordo com a família, grupos de cultura popular irão realizar uma homenagem.
Como homenagem, o prefeito do Recife João Campos (PSB) anunciou, ainda neste sábado (4), a criação do Prêmio Leda Alves da Cultura Popular para "homenagear aqueles que engrandecem este segmento em nossa capital".
Ne metade do século 20, Leda Alves foi testemunha ocular do desenvolvimento do Teatro Popular do Nordeste, um dos movimentos teatrais mais revolucionários do Brasil, que buscou uma maneira nordestina de interpretar e de encenar, além de oferecer ao Recife um teatro profissional e de qualidade artística.
Alves tinha uma vasta experiência no campo do teatro, tendo-se destacado como atriz na encenação de peças famosas do TPN, além da vivência como esposa do teatrólogo Hermilo Borba Filho (1917-1976), com quem trabalhou em várias produções.
Leda Alves ingressou nas artes cênicas em um período ainda bastante resistente à presença das mulheres. "Quando ela era pequena, gostava de encenar, o que era algo comum da infância. Para a mulher, esse espaço de atriz era praticamente o mesmo de prostituta", diz a jornalista Carolina Leão, autora do livro "Os Múltiplos Caminhos de Leda Alves".
"Ela representa essa quebra de padrão, junto com a Geninha Rosa Borges, que foi ingressar junto com esse grupo cosmopolita. No começo, ela era muito ligada ao almoxarifado, exercendo um papel mais administrativo. Ao longo da criação do TPN, ela vai recebendo papéis de protagonismo."
Posteriormente, passou a assumir representatividade na gestão pública, sempre em diálogo com fazedores da cultura popular e levando adiante o legado do marido.
"Sou muito grato de ter convivido um pouco com Leda. Uma mulher realmente admirável, que fez muito pela cultura pernambucana, pela cultura do Brasil, que enfrentou a ditadura, o preconceito", diz Luís Augusto Reis, professor do departamento de artes da UFPE que se dedicou ao legado artístico-intelectual de Hermilo Borba Filho.
"Uma força e uma capacidade vital incrível, então é um momento que lamentamos muito. Ela vai fazer muita falta. Temos a certeza que ela sabe tina cumprido a missão dela com muito brilhantismo, com muita dignidade."
Leda Alves também foi dirigente da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) e presidente da Companhia Editora de Pernambuco (2008-2012), antes de assumir a Secretaria de Cultura do Recife nas gestões de Geraldo Júlio (2013-2020). Também foi diretora do Teatro Santa Isabel e Assessora Especial de Cultura na gestão de Miguel Arraes.
Em agosto de 2022, Alves foi homenageada pelos Almir Fernando e Cida Pedrosa com a entrega da Medalha de Mérito Olegária Mariano, criada para homenagear mulheres que tenham prestado serviços à humanidade e à paz universal. "Eu me alimento disso: conviver com o meu povo de cultura popular. O que é isso que nos dá vontade de ficar junto? É o amor", disse, em discurso, na ocasião.
Importantes autoridades do Estado lamentaram o falecimento da artista. O Prefeito do Recife João Campos (PSB) divulgou uma longa nota: "Leda deixa um sentimento de saudade imenso em todos nós, recifenses, que amamos e valorizamos a cultura. Ela, que era uma verdadeira referência como atriz e ativista cultural, tinha o respeito, o apreço e o carinho do meio artístico. Também foi uma mulher de fibra, que lutou pela democracia, que sempre nos inspirou. E eu tive a oportunidade de crescer aprendendo com Leda, vendo o seu trabalho, vendo a sua vocação para cuidar da cultura e da arte."
"Então, com grande pesar no coração, eu lamento muito a perda sem tamanho de Leda, mas tenho a convicção de que quem vive como ela viveu, de forma intensa e digna, repleta de coisas boas no coração, com contribuições valiosas a dar para tanta gente que fez e faz a cultura, sabe que Leda estará sempre presente. O seu espírito jamais sairá das nossas mentes e dos nossos corações. Viva, Leda! Obrigado por tudo, minha querida amiga", concluiu o prefeito João Campos.
"Dona Leda é uma figura que deixa um legado muito especial para a cultura e para a sociedade. Ela atuou como artista, atuou como gestora e foi sempre um exemplo de luta e princípios, de uma sensibilidade. Isso é muito inspirador. Qualquer pessoa que atua com a área cultural tem recebido muitas mensagens das pessoas se manifestando com essa perda. Eu prefiro registrar o legado, o exemplo, e o que fica de exemplo para tocar esse ofício. É algo que exige muita dedicação, muita paixão", disse os secretário de cultura do Recife Ricardo Mello.
"Pernambuco perdeu hoje Leda Alves que faleceu, no Recife, deixando um importante legado em defesa da nossa cultura, como atriz e gestora pública. Em meu nome e do povo de Pernambuco expresso profunda solidariedade à família e inúmeros amigos neste momento de despedida", destacou a governadora de Pernambuco Raquel Lyra.
Cacau de Paula, secretária de Cultura de Pernambuco, frisou que "falar de Dona Leda é, necessariamente, falar da história do Teatro de Pernambuco e de nossa Cultura Popular". "
Ativista dedicada à valorização de nossas raízes e tradições, viúva de Hermilo Borba Filho, grande amiga de Ariano Suassuna, sempre participou da vida política do estado atuando pela democratização da cultura. Sem dúvidas, fará muita falta aqui, mas sua presença seguirá impressa para sempre nos brinquedos e folguedos do povo pernambucano."
"Dona Leda é patrimônio cultural de Pernambuco. Uma mulher que dedicou toda a sua vida pelo fortalecimento de nossa cultura nas mais variadas formas de expressão. Para mim, é uma fonte de inspiração, de admiração, como artista, mulher e gestora pública", diz Renata Borba, presidente da Fundarpe.
Paulo Câmara, ex-governador de Pernambuco e presidente do Banco do Nordeste, também emitiu nota sobre o falecimento. "Pernambuco perdeu hoje uma defensora intransigente da democracia e da cultura. Lêda Alves sempre participou ativamente da vida política pernambucana seja como atriz e produtora de teatro, seja como gestora pública, na Fundarpe, na Cepe e na Secretaria de Cultura da Prefeitura do Recife", disse.
"Tive a honra de contar com sua contribuição e apoio nas minhas duas eleições para governador. Minha solidariedade aos familiares e amigos. Tenham certeza que o brilho e o talento de Dona Lêda nunca sairão de cena."
Geraldo Júlio, ex-prefeito do Recife que teve Leda Alves em seus quadros de secretariado, disse: "Madrinha do Teatro Santa Isabel, mãe dos artistas da Cultura Popular de Pernambuco, artista valorosa, fez da defesa de nossa cultura uma missão de vida. Leda deixa ensinamentos para todos nós. Eu e Cristina somos alunos dedicados e encantados com a mestra. Tivemos essa oportunidade. Sou grato por ter tido a oportunidade de ter Leda como Secretária de Cultura e amiga nos oito anos que fui Prefeito do Recife.
Roberto Pereira, ex-secretário de educação e cultura de Pernambuco, disse que o Estado está menor com o vazio que o desenlace de Leda Alves causou às artes e à cultura:
"Leda foi múltipla nos seus saberes e fazeres, especialmente na sua dedicação diuturna à cultura popular, o maior legado deixado por ela. Quando, em primeiro de janeiro de 1989, assumi a presidência da Fundação de Cultura Cidade do Recife, recebi de Leda a transmissão do cargo, antes com a entrega dos projetos, incluindo o planejamento do carnaval, tudo nos rigorosos parâmetros da ética e da fraterna solidariedade. Essa postura de Leda foi um gesto cultural em defesa das tradições culturais, deixando-a em espiral crescente de grandeza humana e profissional".
João Baltar Freire, presidente da Companhia Editora de Pernambuco, ressaltou que Leda "deixou grandes contribuições por onde passou e na Cepe não foi diferente". "Esteve à frente da empresa de 2008 a 2012 e, neste período, foi responsável por uma série de iniciativas modernizantes. Criou a editora e o Conselho Editorial, assegurando um padrão de qualidade até hoje refletido em nosso catálogo. Sua partida é uma grande perda para todos nós".