O advogado Pedro Josephi, coordenador da Frente de Luta pelo Transporte Público de Pernambuco, escreve ao blog sobre a mais recente decisão estadual sobre os ônibus na RMR.
O Governo de Pernambuco, conforme noticia a imprensa, já retirou de circulação quase 200 ônibus que atendem ao Sistema de Transporte Público de Passageiros do Grande Recife (STPP/RMR) com a finalidade a reduzir os subsídios aportados pelo Estado no setor. Se compararmos com período pré-pandemia, são 300 ônibus a menos.
Ora, na verdade, isso se configura como uma diminuição da oferta de um serviço público essencial que é o transporte coletivo, e não poderia ser tomada tal medida sem uma consulta prévia, sem um debate mínimo com as comunidades e população diretamente afetada e muito menos sem a anuência do Conselho Superior de Transporte Metropolitano (CSTM). Conselho que não tem sido convocado pelo Governo do Estado desde dezembro de 2022, ou seja, a nova gestão sequer deu posse aos novos conselheiros, e obstaculiza o controle social e fiscalização pela sociedade civil de atitudes arbitrárias como a retirada dos ônibus. Tal situação ensejou, inclusive, representação que
apresentamos ao Ministério Público de Pernambuco nesta quarta-feira (23/08).
A população reclama diariamente da insuficiência de ônibus, do não cumprimento dos horários, das
mudanças abruptas de itinerários e da não eficiência do sistema de transporte. Quem circula e precisa do transporte coletivo se submete cotidianamente a humilhações e indignidade nos Terminais Integrados abarrotados ou ainda em longa espera para ir ao trabalho, faculdade ou chegar em casa. Os problemas são inúmeros e perpassam também pelo modelo de remuneração, de tarifa e pela ausência de licitação e monitoramento no STPP/RMR. A Frente de Luta pelo Transporte Público, em conjunto com outros atores, tem desde 2013 denunciado várias irregularidades, realizado protestos, ações e proposto mudanças estruturais no sistema para adequação à Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei nº 12.587/2012).
Como se sabe a licitação realizada em 2013 teve apenas os contratos do BRT (corredores Norte-Sul e Leste-Oeste) assinados, deixando todo o restante das linhas convencionais de ônibus sem concessão. Ou seja, 75% das linhas operam por meio de permissão, uma autorização temporária que deveria ser renovada a cada período de tempo a partir do cumprimento de metas e melhorias do serviço, o que também não tem sido aferido pelo Grande Recife (um dos pontos constantes da nossa representação). Nesse sentido, tem-se no STPP/RMR uma dupla regulação: duas empresas concessionárias que são remuneradas por meio do índice de Preço de Remuneração ao Operador (PRO), composto pelo valor da passagem e subsídios governamentais, e sete permissionárias que são remuneradas com o valor das passagens de ônibus.
O Estado de Pernambuco gasta cerca de R$ 255 milhões por ano a título de subsídios para o sistema de transporte, fora outras receitas, tais como a compra antecipada de passagens e o aporte em caso de “déficit”. Por outro lado, conforme a legislação, os subsídios só poderiam ser utilizados para os serviços delegados por concessão.
Portanto, estranha a justificativa do governo de retirada de 200 ônibus para reduzir os gastos com subsídios, sendo que as linhas que estão sendo atingidas são operadas por permissionárias (remuneradas pela tarifa) e não concessionárias.
Certamente, o desafio da nova Governadora é grande, sobretudo, por ter herdado um sistema capenga, desestruturado, ineficiente e com níveis insatisfatórios de qualidade, mas, acredito que não é direcionando ao povo pernambucano as consequências destes malfeitos que conseguiremos avançar na regulação, eficiência, modicidade tarifária e responsabilidade fiscal. A descontinuidade do serviço público essencial, com a retirada sumária de 200 ônibus (sem discussão, vide não convocação do Conselho Superior de Transporte), neste cenário, é desumano e vai penalizar o usuário, que já enfrenta o caos no seu dia a dia.
Iremos solicitar que o Grande Recife reveja tal posição imediatamente, e, caso, não seja acolhida ou melhor debatida no âmbito do CSTM, vamos solicitar a redução do valor das passagens. Se diminuiu o serviço, tem que diminuir a tarifa!